[PT]
“É sempre uma tarefa difícil escrever um texto que tente dar conta das tantas relações possíveis entre todas as referências e trabalhos que compõem a experiência de uma exposição. Talvez pudesse começar falando de quando desisti de ler sobre o “corte” lacaniano, cujos efeitos eu já havia entendido (sem entender) depois de algumas sessões de análise. Ou talvez pudesse começar falando das horas que gastei pensando sobre o que Gaston Bachelard chamara de “corte epistemológico” para referir-se ao momento em que há uma ruptura tão grande em determinada ciência que possibilita o surgimento de outra que nada se assemelha àquela que lhe deu origem. Talvez pudesse comentar o que li, a toque de caixa, na Wikipédia — esta enciclopédia que uma amiga apelidou com toda razão de “mutatis mutandis” — sobre a “mesa de corte” do audiovisual que, em inglês, chama-se vision mixer: um equipamento, abre aspas, utilizado para selecionar entre várias fontes de vídeo diferentes e, em alguns casos, compor fontes de vídeo para criar efeitos especiais, fecha aspas. Talvez, ainda, pudesse falar sobre o dia em que me ocorreu a ideia de uma “mesa de corte”, depois de ver a mesa de trabalho de Joélson Buggilla, exatamente durante o encontro em que ele me dissera que não “recortava”, mas “cortava”, porque não utilizava a tesoura, mas o “bisturi”. Talvez, ainda, e ainda, pudesse falar sobre a vez em que o Nino Cais me abrira as gavetas de sua mapoteca para mostrar alguns de seus trabalhos mais recentes, enquanto conversávamos sobre o que ele chamou de uma “economia do corte” que definiu como “a mínima intervenção possível
Nesta Experiência S/N. MESA DE CORTE, pode-se compreender o corte como uma tomada de partido em relação aos signos que servem às narrativas oficiais da história e coloque em crise sua forma, seu conteúdo e seu modus operandi; um corte que reivindique outros modos de escrever, ler, representar e ver essas narrativas ao expor as suas incoerências, equívocos e injustiças que se fazem valer pela força do poder e da insistência.”
Texto: Maykson Cardoso (curador)
[EN]
“It is always a difficult task to write a text that tries to account for the many possible relationships between all the references and works that make up the experience of an exhibition. Perhaps I could start by talking about when I gave up reading about the Lacanian “cut”, whose effects I already understood (without understanding) after a few sessions of analysis. Or maybe I could start by talking about the hours I spent thinking about what Gaston Bachelard called an “epistemological break” to refer to the moment when there is such a big rupture in a certain science that makes possible the emergence of another science that is nothing like the one that gave rise to it. Perhaps I could comment on what I read, out of the box, on Wikipedia — this encyclopedia that a friend rightly called “mutatis mutandis” — about the “cutting table” of the audiovisual which, in English, is called vision mixer: an equipment, open quotes, used to select between several different video sources and, in some cases, compose video sources to create special effects, unquote. Perhaps, still, I could talk about the day when the idea of a “cutting table” occurred to me, after seeing the work table of Joélson Buggilla, exactly during the meeting in which he had told me that he did not “cut”, but “trim”, because he did not use scissors, but the “scalpel”. Maybe, still, and still, I could talk about the time when Nino Cais opened the drawers of his map library to show me some of his most recent works, while we talked about what he called an “economy of the cut” that he defined as “the least possible intervention”
In this Experience Y/N. CUTTING TABLE, one can understand the cut as a taking of sides in relation to the signs that serve the official narratives of history and put in crisis its form, its content and its modus operandi; a cut that claims other ways of writing, reading, representing and seeing these narratives by exposing their inconsistencies, mistakes and injustices that assert themselves through the force of power and insistence.”
Text: Maykson Cardoso (curator)